RIO - Na
mesma semana em que reconheceu perdas de R$ 6,2 bilhões por corrupção no
balanço da Petrobras, Aldemir Bendine recebeu para uma entrevista numa sala de
reuniões na sede da empresa, na Avenida Chile. Na lapela, um broche de Nossa
Senhora Aparecida e o logotipo da companhia. Na parede, um mapa com os campos
de petróleo e uma lupa. Bendine afirma que já trabalha em um “plano B” para
tocar os projetos da estatal, mas admite que pode haver mais atrasos em obras.
A crise de
fornecedores preocupa?
Sim. Essa
situação balançou muitos fornecedores que já estavam capacitados. Por outro
lado, estamos vendo novos fornecedores e parceiros interessados em aumentar
parcerias. O que temos que trabalhar muito fortemente seria um “plano B”para
formar e capacitar novos fornecedores. Entendo que uma parte desses
fornecedores hoje envolvidos nessa situação pode não dar continuidade a seu
trabalho.
Mas dá tempo
para capacitar, já que há fornecedores envolvidos em diversos projetos?
Aí, nós teríamos
atraso. Se esse processo de conclusão (Operação Lava-Jato) for muito demorado,
quanto mais atrasar, mais vai comprometer a execução do nosso plano de
investimento. No pré-sal, a situação não terá um impacto tão elevado. O que vai
ter um impacto mais elevado são os investimentos físicos, obras, como
plataformas. No pré-sal, do ponto de vista do fornecimento, a maior parte das
empresas não faz parte desse processo em curso. Talvez você pegue uma SBM, que
é uma importante fornecedora, mas que a gente vê caminhando para uma solução.
A
capacitação será de empresas brasileiras ou estrangeiras?
Os dois, mas
com prioridade para os brasileiros. A gente tem de priorizar aquilo que pode
trazer melhores ganhos para a economia do país.
Plataformas
em construção no Brasil podem ser feitas pelos chineses?
Não existe
isso. Se a China tiver interesse, a China vem aqui construir em parceria ou
assumir projetos aqui.
Que projetos
podem atrasar?
Em
exploração, não estou preocupado. Vamos dar um exemplo do que é muito caro ao
Rio: a situação do Comperj (Complexo Petroquímico, em Itaboraí, no Rio). Hoje,
o primeiro trem (unidade) da refinaria tem 86% conclusos. Vamos terminar
aquilo. Não tenha dúvida. Não vou deixar um projeto daquele, com um
investimento tão alto, jogado. Agora, dependo de duas coisas: ajustar a minha
condição de caixa — em breve vamos nos pronunciar sobre isso — e que eu tenha
fornecedores. Vamos ter de fazer uma repactuação. Temos uma série de empresas e
consórcios. Algumas podem não ter interesse em permanecer, outras estão em
dificuldades financeiras. Vamos ter de sentar à mesa e ver quem tem condições
de continuar.
O Comperj só
será concluído em 2019? (A previsão anterior era 2016.)
Esse é o
pior dos prazos. O melhor dos prazos é fazer uma engenharia financeira que
permita ter recurso suficiente para concluir a obra. Não tem quando.
Existe a
possibilidade de a Petrobras recuperar os R$ 6,2 bilhões de perdas por
corrupção?
Sim. Quem sabe
mais, né? Isso vai depender do acordo.
A corrupção
foi estancada?
A corrupção
existe na empresa pública, na sociedade de economia mista ou na empresa
privada. A questão de corrupção é uma questão de caráter. O que você pode fazer
é criar mecanismos de controle e mitigar o risco. Sujeita à corrupção, qualquer
empresa do mundo está. Agora, conhecendo o caráter e a honradez e pelo que
passou essa empresa, não tenho dúvida de que a possibilidade de isso voltar a
acontecer é mínima. Corrupção é um câncer que compromete muito a companhia.
Acabou esse negócio de operação (Lava-Jato). Mas temos que ser tratados como
companhia. Tem que acabar com essa ansiedade em relação à Petrobras.
O senhor
defende o acordo de leniência das empresas?
Sem dúvida.
Quem errou em relação a isso ou aquilo tem que ser punido, investigado e pagar
pelos custos daquilo que praticou. Mas não é justo as empresas morrerem por
conta de malfeitos de seus dirigentes, até porque o país não pode parar. É uma
condição insuportável.
Já houve
punições a funcionários?
Várias.
Demissões, downgrade nas comissões ou nos cargos. Não podemos fornecer os dados
ainda. Tudo que vocês ouvirem disso é especulação. Temos uma comissão que
gerencia de forma independente. O processo continua.
Qual foi o
pior momento desde que o senhor foi convidado para o cargo?
O pior
momento foi a parte do convite (risos). Estava numa projeção de vida futura
(tinha sido convidado para assumir o BNDES) e a vida virou de cabeça (para
baixo).
E o ritmo de
trabalho?
É bastante
intenso. Não sou um cara fissurado em horário de trabalho, mas saio muito
tarde. Isso daí eu tenho de me disciplinar mais. Se não, não vou aproveitar as
belezas do Rio de Janeiro. Não tenho vida neste primeiro momento.
Em menos de
três meses, o senhor lidou com o balanço e fez captação de quase R$ 30 bilhões,
mas foi criticado por usar bancos públicos, como o Banco do Brasil, que o
senhor presidiu...
Eu interferi
no BB, na Caixa, no Bradesco, no Standard (Chartered) e nos chineses? O Banco
do Brasil tem governança corporativa. Nem se eu pegasse na mão do Alexandre
Abreu (presidente do BB) e forçasse ele a assinar o empréstimo. É o potencial
de negócio. O objetivo disso é mostrar que a empresa tinha financiabilidade.
É que vocês
não costumavam fazer operações com bancos públicos. Só em casos de desespero...
Nós
(Petrobras) não costumávamos fazer um monte de coisa. E faziam coisas que não
deviam. Minha resposta aqui é de 9 de fevereiro (quando assumiu o cargo) para
frente e com minha visão financeira.
Podemos
esperar novas operações?
Diante de
uma boa prática, sim. Assim como novas captações, não tenho dúvida. O mercado
se abriu de novo para nós. O que eu garanto é que o problema de
financiabilidade deste ano já está resolvido. Posso tocar a vidinha aqui
quietinho até dezembro sem necessidade de novas captações.
Vai captar
quanto em 2016?
Deve ser
muito similar à captação deste ano. Um patamar muito parecido.
Quanto tempo
precisa para resolver a questão financeira?
Se nada
fosse feito, só trabalhar em cima da geração de caixa é um processo gradual de
pelo menos cinco anos. Mas vai depender da engenharia financeira. Vamos
investir no hedge (proteção cambial). Já temos um hedge muito bom, mas não
cobre tudo. Determinadas dívidas e captações em outra moedas não estão com
mecanismo de proteção. Vamos contratar ou desenvolver mecanismos de proteção.
O que se
pode esperar do Plano de Negócios em relação à produção?
De igual a
maior. Não queremos diminuir a produção. Vamos dar agora uma previsibilidade
melhor ao longo do mês. Tem mês que vai subir bastante, tem mês que vai cair
por paradas programadas. (O Plano) Dará melhor previsibilidade mês a mês. Hoje,
a gente simplesmente divulga que vai crescer a produção em 2%. Queremos dizer
que vamos crescer em X% e já dizer que (por exemplo) não se assustem que no mês
de maio pode haver queda.
A Petrobras
foi criticada pelo uso político do reajuste dos combustíveis. Quando vai ter
aumento?
Daqui para
frente, a companhia tem inteira liberdade para esse tipo de trabalho. Hoje,
estamos com bom resultado sobre o retorno pretendido, em paridade internacional
e com margem muito boa. Não estamos com defasagem. Está dentro da metodologia
de preço (câmbio, preço do petróleo e demanda). Se o conjunto dos indicativos
dessa metodologia sofrer alterações, vai haver aumento. Hoje, com o retrato
atual, não há essa previsibilidade.
Como está a
contratação das 28 sondas de exploração do pré-sal que serão construídas pela
Sete Brasil (investigada na Lava-Jato)?
Foi feito um
memorando de entendimentos para se redesenhar esse modelo. Acordamos um prazo
de 90 dias, e os envolvidos estão trabalhando para delimitar qual é o número
(de sondas) a ser contratado (pela Petrobras) neste primeiro momento. Já há de
seis a oito sondas perto de serem concluídas e que atendem as necessidade
prementes da companhia. E, depois, dentro de um planejamento mais alongado, não
terá talvez a necessidade a médio prazo de ter as 28 sondas. Talvez um numero
menor atenda essa situação. É lógico que esse processo não concluso das
investigações acaba acarretando um atraso em relação a isso.
Como está a
situação da Petros (fundo de pensão da Petrobras)?
Trocamos
toda a diretoria. A Petros vai passar por um processo muito parecido com que a
Petrobras está passando. Não tenho dúvida de que ela tem de ter uma gestão
igual à da empresa. Não existe a possibilidade de só a empresa arcar com
déficit. Não vejo, a princípio, a necessidade de contribuições extemporâneas no
futuro próximo.
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