'O que
importa é o amor, não importa se é de sangue', diz uma das mulheres.
Eles
nasceram em Garanhuns e famílias esperam indenização de R$ 300 mil.
Quando
assistia pela televisão a histórias de bebês trocados na maternidade, a
agricultora Maria do Carmo Ferreira dos Santos imaginava que, caso isso
acontecesse com ela, iria procurar o biológico e querer ficar com ele. Mesmo
avaliando assim, jamais percebeu que um dos quatro filhos não era o que havia
dado à luz, em 1998, no Hospital Regional Dom Moura, em Garanhuns, Agreste
pernambucano. Ela descobriu a situação há mais de dez anos, mas, não por acaso.
Em outra
parte da cidade, a comerciante Josenalda Oliveira Bernardo, de 44 anos, chegou
à conclusão de que o mais novo dos três filhos não era o mesmo que tinha
carregado no ventre. Ele fez um exame e a mãe descobriu que o tipo sanguíneo
era diferente dos demais. Então, ela decidiu fazer um teste de DNA e confirmou
que o menino foi gerado por outra mãe.
Com a nova
informação, a angústia e o instinto materno fizeram as buscas começarem.
Josenalda saiu de porta em porta procurando a outra família até descobrir que
eles também moravam em Garanhuns. Devido à descoberta, as duas mães passaram
por momentos de depressão e pela sensação de injustiça. Porém, decidiram
continuar com as crianças que estavam. “A partir do momento que você sai do
hospital, você já está apaixonado pela criancinha. Eu já saí apaixonada por
ele”, lembra a comerciante.
Os meninos
estão com 16 anos e Josenalda relata que as duas mães trocam experiências sobre
eles. “A gente escolheu o melhor jeito de viver. Primeiro veio o sofrimento,
depois veio o amor dobrado”. Desta forma, já não fazia mais sentido o que Maria
do Carmo imaginava, ao ver pela TV os casos de trocas de bebês. “Não é bem
assim. O amor de mãe fala mais alto. O amor do dia a dia. Eu criei ele desde o
momento que nasceu, amamentei, cuidei, amei. Aí, existe aquele vínculo
realmente de mãe e filho. Mesmo não sendo o meu filho de sangue, ele é meu
filho de coração”, afirma Maria do Carmo, atualmente com 53 anos.
Para Lucas
Ferreira, filho biológico de Josenalda, e para José Ronaldo Bernardo, de Maria
do Carmo, ter duas mães assim ainda é um pouco complicado. O primeiro já ouviu
comentários maldosos e reforça o ensinamento da mãe de criação: "Ela disse
'Nem ligue. Você é meu filho e pronto!'" É com orientações como esta que
eles conseguem superar, ao lado das mães de criação e das "madrinhas"
- como são chamadas as biológicas. "Mãe é mãe e não pode deixar de
ser", diz José Ronaldo.
Exemplo da
família
A mãe da
agricultora Maria do Carmo tem 96 anos e acolheu cinco filhos de criação. Ela
ressalta que eles, biológicos ou não, devem ser tratados com igualdade. “Nunca
me arrependi de ter criado meus filhos. Só em ser filho assim, [nos] considera
mais. Meus filhos são iguais. Não gosto de quem pega o filho dos outros e vai
‘judiar’”, conta a aposentada Paulina Maria da Conceição.
O auxiliar
de depósito Aguinaldo Gouveia dos Santos, 29 anos, é um dos filhos que Paulina
recebeu. Para ele, o fato de não ter crescido com a mãe biológica não diminui o
amor que sente pela aposentada. “Minha mãe me deu muito amor, muito carinho,
muita educação. Eu creio que mãe não é só aquela que gera, mas aquela que cria.
E minha mãe é um exemplo disso. Por isso que estou aqui. Amo muito ela”. Àqueles
que vivem situação parecida, Aguinaldo deixa um recado. “Que todos amem a sua
mãe. Independente de ser ou não filho, mas é a mãe”.
A história
da mãe inspirou Maria do Carmo. “Eu aprendi que o amor vem junto. Quando se
fala ‘filho de criação’, as pessoas acham que existe uma diferença. Mas não
existe. O que importa é o amor. Não importa se é de sangue. É amor. Porque o
filho adotivo é filho. Ele não deixa de ser seu filho”, detalha.
Indenização
O governo de
Pernambuco foi condenado a pagar R$ 300 mil pela troca dos bebês. Cada família
deverá receber R$ 150 mil. De acordo com o juiz da Vara da Fazenda Pública de
Garanhuns, Glacidelson Antônio da Silva, o estado já esgotou todos os recursos.
“O STJ
[Supremo Tribunal de Justiça], assim como a primeira instância e o TJPE
[Tribunal de Justiça do estado], reconheceu o dano causado às famílias. O
processo deve agora voltar para o TJ, que vai nos encaminhar. Quando isso
ocorrer, iremos começar a cobrança dos valores”. Ainda de acordo com o juiz, a
previsão é de que o valor seja pago, no mínimo, a partir de 2017.
Para Maria
do Carmo, o valor da indenização não muda toda a história vivida. “O que mudou
é que, assim, eu fiquei sabendo que tinha mais um filho. E o lugar desse filho
está vazio. Mesmo eu sabendo onde ele mora, o lugar dele ficou vazio. São cinco
filhos, mas um filho não substitui outro”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário