Finalmente o
módulo de carga Progress caiu na Terra, ou melhor, reentrou. Pouco depois das
23 horas desta quinta-feira (7), a agência espacial russa Roscosmos soltou um
comunicado afirmando que o módulo tinha caído às 23h04 e ponto final. Nenhum
comentário sobre como eles haviam chegado a essa afirmação. Sem isso, analistas
e "voyeurs" de lixo espacial questionaram se esse horário havia sido
fruto de uma simulação ou uma observação propriamente dita. Simulando a órbita
da Progress, o local da queda seria bem no meio do Oceano Pacífico, na altura
da linha do equador.
Alguns
minutos depois, a USSTRATCOM, aquele órgão da defesa norte-americana que citei
em posts anteriores soltou um comunicado afirmando (baseado em simulações) que
a Progress tinha caído um pouco mais tarde, às 23h20, com erro de 1 minuto para
mais e para menos. Com base neste horário, o módulo teria caído bem ao sul do
Oceano Pacífico, a uns 1.300 km à oeste da costa do Chile, bem no finzinho da Terra
do Fogo, bem próximo do local onde o terceiro estágio do foguete Soyuz 2-1A
tinha caído alguns dias antes.
Mas por que
se fala em simulações? Não há acompanhamento "real" do módulo? E
aqueles sites todos que mostravam em tempo real a posição dele?
O que
acontece é o seguinte: é possível monitorar um objeto no espaço com dados
"reais". Quando um satélite é posto em órbita, ele continuamente
envia dados de telemetria para a Terra, que são captados por antenas ao redor
do mundo e com esses dados é possível descrever a trajetória dele. Há de se
considerar que não existe uma linha de antenas perfiladas sobre a superfície
para receber esses dados e, com isso, apenas as antenas que podem
"enxergar" a passagem do satélite é que vão conseguir coletar esses
dados. Monitoramento por radar também é feito, mas aí é até mais complicado,
pois antenas assim são mais raras ainda.
O que se faz
na realidade é usar todos os parâmetros da órbita de um satélite (a partir dos
dados da telemetria e dos radares em Terra), como velocidade, apogeu (maior
altura da órbita), perigeu (menor altura da órbita), por exemplo, para calcular
sua trajetória. Isso é o que é mostrado nesses sites. Dependendo do caso, mesmo
depois de cair, os sites ainda mostram o objeto em órbita por horas e até dias.
A previsão
dos americanos é muito mais precisa, com uma margem de erro bem pequena, de
modo que todos estão assumindo que ela esteja correta. A confirmação só pode
ser feita se houver avistamento dos destroços caindo, que não deve ter
ocorrido, pois não deve ter muita gente no final da Terra do Fogo. Mas é certo
que a Progress não está mais em órbita, pois os radares de defesa americanos
deixaram de detectá-lo.
E quanto aos
destroços, é possível resgatá-los?
Em
princípio, sim. Apesar do módulo ter sido projetado para se desintegrar na
reentrada, algumas peças sobrevivem às altas temperaturas do atrito com a
atmosfera. Os motores, os cones de exaustão dos foguetes são fabricados para
operar em temperaturas muito altas, não podem derreter. Já outras peças, como
as rodas de inércia que ajudam a estabilizar a nave são muito densas, feitas de
material maciço e dificilmente são destruídas na reentrada. Por esse motivo, a
reentrada controlada sobre áreas remotas é tão importante.
Caindo no
mar a coisa complica, claro. A localização é difícil (vide os casos dos aviões
da Malaysia Air Line) e quase tudo deve afundar. Caindo em terra firme, a
missão de resgate é um pouco mais fácil, mas só um pouco.
Os destroços
não caem aglomerados em um ponto, mas sim espalhados em uma mancha sobre a
superfície que pode ter até 800 km de extensão. A nave quando reentra na
atmosfera tem uma alta velocidade de queda, mas em duas componentes, uma
vertical e outra horizontal. A soma (vetorial) das duas é que dá a velocidade
total. Como a nave entra bem de rasante, a componente horizontal da velocidade
é muito grande, bem maior que a componente vertical, e é o que faz com que os
destroços caiam em diferentes pontos da superfície.
No caso da
Progress, dado todos os elementos de sua trajetória final, a estimativa é que
eles possam estar distribuídos ao longo de uma linha de até 800 km de extensão.
Esse mapa
mostra aonde procurar.
As marcas em
vermelho mostram o início (ponto A) e o término (ponto B) da janela de
reentrada, 23h19 e 23h21 respectivamente, de acordo com o USSTRATCOM.
Se a
Progress reentrou na abertura da janela, os destroços devem ter caído entre as
marcas azuis. Se reentrou no término da janela, os destroços devem ser
procurados entre as marcas verdes. A distância entre o primeiro ponto azul e o
último ponto verde, o que representa a linha em que a probabilidade de se encontrar
algum tipo de destroço é maior, é
superior a 1.500 km e quase chega às Ilhas Malvinas que estão no Oceano
Atlântico! Apenas uma pequena parte desta linha de destroços está sobre terra
firme, mesmo assim numa região bem remota.
É bem
provável que nunca tenhamos nenhum pedaço da Progress resgatado, mas como o sul
da Terra do Fogo está no roteiro de aventureiros (no meu inclusive) pode ser
que alguém acabe topando com alguma coisa.
Em tempo:
não há artefatos radioativos e o propelente altamente tóxico usado nos jatos de
manobra já deve ter se consumido com o calor da reentrada.
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